O jovem em A.A.

jvensO conceito de juventude dentro de A.A. trouxe um sentido diferente para o meu modo de entender o "ser jovem".

Cheguei em A.A. aos 33 anos e na bagagem, além de muitos sofrimento, guardava grandes frustrações pelo fato de não haver construído nada de concreto em minha vida.

Comparava-me com amigas que trilharam caminhos saudáveis e que, com a mesma idade que eu, já tinham definidas suas profissões, além de terem constituído família e gerado filhos.

No meu passado alcoólico ativo, enquanto essas mesmas amigas construíam seus sucessos oriundos de esforços e restrições comuns, eu simplesmente escolhi os atalhos de uma vida sem compromissos, sem regras ou planejamentos. O pior é que me via em melhor lugar do que elas. Achava que elas estavam perdendo tempo e eu, ganhando a vida!

O álcool me facilitava obter "status" de mulher independente, corajosa e à frente do meu tempo, pois vivia em núcleos de pessoas ligadas à arte, música, teatro e nesse universo tudo parecia ser fácil, leve e solto!

Pregávamos a paz e o amor livres e mal sabíamos quão prejudicadas éramos por "coisificarmos" nossas relações com as pessoas.

Sim! Estabelecíamos relações descartáveis e a prática do hedonismo era a filosofia de vida daquele meu tempo.

Assim segui durante a minha juventude, devastando pessoas (especialmente a mim mesma) e afetos, em nome de minha liberdade.

Justificava meu comportamento alcoólico que se manifestava na dificuldade de adequação, de concentração e na desobediência aos códigos sociais,dizendo que eu estava além daquilo tudo e que meu espírito era livre demais para pertencer a algum sistema retrógrado como o da sociedade patriarcal. Não me submetia a relacionamentos duradouros nem às normas de conduta. Além de vociferar contra o sistema educacional e de me rebelar contra professores e diretores na época da faculdade; eu a interrompi por duas vezes: frutos amargos que colho por ainda estar suspensa esta etapa da minha vida.

Fundamentei meus conceitos acerca de ser jovem e mulher em parâmetros e códigos totalmente distorcidos. A ousadia, comum à minha personalidade me levou a aventuras bastante perigosas e toda a minha juventude foi pautada em ações fora da lei, fora de princípios, fora de uma vida serena e pacata. Minha doença pedia muita adrenalina e muito risco de vida. Eu acreditava que possuía vantagens em não ter paradeiro e em não andar na linha.

Ao ingressar em a.A. levou algum tempo para que eu entendesse o ponto de vista dos AAs em relação ao ser JOVEM.

Eu me cobrava muito por ter chegado totalmente destruída e sozinha. Descobri que não construí família nem gerei filhos ou me estabeleci profissionalmente por não ter tido condições emocionais e espirituais para tal e não porque eu NÃO QUIS ou me sentia à frente do meu tempo. Ao contrário do que pensava, eu não era livre e feliz. Seguia a cartilha do alcoolismo, aprisionada e vagueante. Consequentemente me sentia velha demais para começar uma nova vida.

Porém, em A.A. ouvi companheiros que chegaram com muito mais tempo de vida que eu: aos 50, 60, 70 anos de idade e que ainda tinham o brilho e esperanças comuns à juventude. Diziam que sua vida havia começado ali em A.A. e comemoravam seu tempo de sobriedade como se fosse o tempo em que começaram a viver. De fato é isso!


Em A.A. somos todos jovens, pois nos renovamos a cada 24 horas.

Tento me valer do meu tempo em A.A. e aqui estou no meu primeiro ano de vida: um ano em que venho recebendo dádivas e condições emocionais de me perdoar por tanto tempo outrora perdido. Os "menos jovens" que eu na Irmandade abastecem meu ser com doses singelas de otimismo e amor.

  • Ainda há tempo?
  • Sempre há tempo para construir ou reconstruir a vida.
  • Os mais jovens que eu mostram que as mazelas da vida alcoólica continuam iguais ao meu tempo e que o álcool mantém seu império devastador.
  • É bonito ver jovens e antigos se aliando na jornada da recuperação.
  • A nova vida de a.A. permite que nos igualemos na escala do tempo.
  • É como se zerássemos o cronômetro e dali - do ponto inicial - jovens, antigos, mulheres e homens iniciássemos nossa nova caminhada.
  • O Poder Superior nos concede, independentemente da idade, a chance de usufruir a plenitude da vida - sem os ditames do álcool.

Juliana/Rio de Janeiro/RJ
Vivência nº109 – Setembro/Outubro/2007.


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