Bernard B. Smith (1901 -1970)

Box 4-5-9, Out. Nov. / 2008 (pág. 3 a 5) 

Título original: “Bern Smith: Uno de los principales arquitectos de la Conferencia de Servicios Generales”.

Nas últimas horas da tarde de um dia de 1944, três homens chegaram ao escritório de Bernard. B. Smith, um proeminente advogado de Nova York especializado em Direito Societário e Comercial. O objetivo dos três homens era a contratação do advogado para a formação de uma sociedade que seria conhecida como “Fundação do Alcoólico”. Smith, conhecido entre seus amigos como “Bern”, não sabia muita coisa a respeito do alcoolismo ou de Alcoólicos Anônimos. Mas, imediatamente ficou impressionado com o cofundador de A.A., Bill W., um dos três visitantes.

Mais tarde, Bern descreveria Bill como “um homem de aspecto parecido com Lincoln, porém sem barba, alto e esguio, vestido com um terno amassado”. Intuitivamente, Bern sentiu que gostaria de conhecer a Bill, e convidou-o para jantar essa mesma noite. (Bill aceitou de bom grado e Bern mais tarde pensou que a perspectiva de um bom jantar poderia ser muito atraente para Bill naquela fase de dificuldades na sua vida). Bern lembrou que durante o jantar, mantendo seu comportamento de advogado, começou a interrogar a Bill a respeito do que poderia ter A.A. para tornar possível a um alcoólico alcançar a sobriedade. “Nessa noite fiquei sabendo que A.A. tinha uma base espiritual”, disse. “Ele me explicou que um alcoólico que deixou de beber pode ajudar outro que ainda bebe. Naquela noite fiquei sabendo que não foi pela ciência nem pelo uso de revigorantes ou tranquilizantes psíquicos que Alcoólicos Anônimos estava conseguindo deter a doença do alcoolismo, mas através de permanentes preceitos de humildade, honestidade, devoção e amor,

A.A. começava a ter sucesso onde outros esforços para resolver o problema do alcoolismo tinham fracassado”. Isto foi o começo de uma amizade que iria durar até a morte de Bern em 1970. Ele logo chegaria a Custódio não alcoólico e, posteriormente, presidente da Junta de Serviços Gerais. Também se converteria num forte aliado de Bill, numa Junta que às vezes ficava dividida a respeito de determinados assuntos. Uma de suas contribuições mais importantes foi o apoio que deu a Bill para estabelecer a Conferência de Serviços Gerais. O conhecimento por parte de Bern dos aspectos legais e práticos contribuiu de tal maneira no planejamento da Conferência, que Bill o chamou de se” arquiteto”. Mas Bern manteve-se no segundo plano na maior parte do tempo, e a Irmandade em geral o conhecia apenas pelas referências que Bill fazia a ele nas suas palestras e lembranças.

Bern era natural de Nova York, nascido no Bronx o dia 23 de dezembro de 1901. Ali foi criado e formou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Nova York, antes de iniciar uma bem-sucedida carreira de advogado. Morou em Manhattan com sua mulher Sylvia e suas duas filhas. Os pais de Bern tinham emigrado da Rússia para os EUA, onde seu pai trabalhou na indústria do vestiário. A família estava fadada ao sucesso; Carl, o irmão mais velho de Bern, distinguiu-se como professor de pediatria na Faculdade de Medicina da Universidade de Cornell. Sua irmã, Josephine, graduou-se no Hunter College e chegou a ser professora no ensino primário. Tanto Carl quanto Bern escreveram artigos e livros nas suas respectivas áreas. Os escritos de Carl a respeito das doenças do sangue em criança tinham elevada consideração, e Bern escreveu sobre comercio internacional, a indústria da construção e a televisão.

Em 1957 Bern foi nomeado Comandante Honorário da Ordem do Império Britânico pela rainha Elizabeth. No começo, parecia estranho que Bern sentisse tanta atração por A.A. Não havia alcoolismo na sua família, e ele se descrevia como um bebedor moderado que nuca teve problemas com o álcool. Mas lembrava de um amigo sensível e muito talentoso que tinha morrido por causa do alcoolismo. Este amigo tinha sido contratado para fazer um mural e tinham-se adotado medidas especiais para mantê-lo sóbrio enquanto realizava o trabalho. Porém, antes de concluir o projeto amarrou uma bebedeira mortal. Não conseguiram encontrar nenhum artista com seu talento para substituí-lo e o mural nunca foi concluído. Nas palavras de Bern, o mural ficou como “um monumento a um artista supremo, e o espaço em branco como o tumulo de um alcoólico”.

Inclusive durante seu primeiro encontro com Bill, Bern contagiou-se com o que ele via como o milagre de A.A. e o que estava fazendo no mundo, embora a Irmandade, em 1944, tivesse apenas uns 10.000 membros – mas crescia muito rapidamente. Ele se lembrava de outros amigos alcoólicos aos quais não pôde ajudar, a através de Bill soube porquê seus tímidos esforços tinham fracassado. ”Raríssimas vezes, talvez alguma, um não alcoólico pode ajudar um alcoólico”, disse numa sessão na Convenção Internacional de A.A. de 1965 em Toronto, Canadá. ”Conforme Bill falava comigo aquela tarde percebi que alguma coisa muito importante estava acontecendo na sociedade humana”, disse referindo-se ao seu primeiro encontro com Bill. “Certamente foi uma das tardes mais estimulantes da minha vida. E tal como me foi pedido, comecei a formalizar a Fundação do Alcoólico como corporação e pouco depois iniciei meus 21 anos como servidor Custódio”, (Seu período de serviço em A.A. alcançou 26 anos). Inclusive nessa fase inicial, Bill disse a Bern que desejava estipular que houvesse uma maioria de não alcoólicos na Junta de Custódios e diretores da Fundação. Quando Bern perguntou o porquê esta distinção seria necessária, Bill explicou que os alcoólicos recuperados em A.A. estavam apenas a um trago de voltar ao desastre. Bern incluiu este requisito na Carta de Constituição da Fundação embora se tenha visto obrigado a se referir aos membros alcoólicos como “ex alcoólicos”, um termo não utilizado pelos membros de A.A.

Quando Bern apresentou a solicitação para inscrever a Carta de Constituição em nome da Junta, o secretário do Estado de Nova York encarregado de recebê-la observou que alguns Custódios eram não alcoólicos e outros alcoólicos. Preocupado com essa diferenciação, perguntou a Bern, “Como você pode distinguir esta diferença do ponto de vista legal? ”. Não foi fácil responder, mas a Bern finalmente lhe ocorreu esta explicação que satisfez os especialistas em leis: “Sentem todos em volta de uma mesa e ponham um uísque com soda na frente da cada um. Os que não o beberem são os alcoólicos”.

A explicação funcionou e a Junta obteve sua Carta Constitutiva. O serviço de Bern começou quando Bill se encontrava no processo de desenvolvimento das Tradições, que finalmente seriam aprovadas na Primeira Convenção Internacional de Cleveland, em 1950. Embora Bill tenha escrito os Doze Passos em 20 ou 30 minutos, a preparação e aprovação das Doze Tradições, iria-se prolongar ao longo de vários anos. Bern se lembrava de não estar totalmente de acordo com Bill a respeito de adotar a Sétima Tradição, que diz que A.A. não deve aceitar contribuições alheias à Irmandade. “Bill precisava insistir reunião após reunião sobre as razões pelas quais A.A. deveria ser autossuficiente e porquê não deveria aceitar ajuda financeira do mundo não alcoólico”, lembrava Bern, ao mesmo tempo que indicava que Bill e Lois viviam então em “estado de necessidade”, e a Junta gostaria de ter mais dinheiro para poder ajudá-lo a levar uma vida um pouco mais cômoda. Apesar desse estado de necessidade, Bill persistiu na ideia e essa Tradição, como as outras, finalmente tomou forma. Bern confessou que teve momentos de dúvidas quando, como presidente, tinha que assinar cartas rejeitando milhares de dólares em doações e presentes. Entretanto, Bern diria mais tarde, Bill sabia que uma sociedade com baseada na espiritualidade tal como Alcoólicos Anônimos deveria isolar-se das pressões materialistas que, não fosse por esta Tradição, “poderiam vulnerar a unidade desta grande Irmandade”.

Os membros de A.A. costumam acreditar que não há coincidências e que boas coisas acontecerão à Irmandade sob a orientação de Deus. Parece ser algo providencial o fato de Bern estar na Junta de Serviços Gerais em 1951 quando Bill começou a apresentar a ideia de uma Conferência de Serviços Gerais para representas a Irmandade de Alcoólicos Anônimos no seu nível básico. Bill acreditava, e Bern também, que no futuro a Irmandade poder-se-ia dividir se o Escritório de Serviços Gerais e suas funções não estiverem vinculados a um organismo representativo da Irmandade em seu conjunto. Acreditavam que uma Conferência de Serviços Gerais era essencial para a continuidade da Irmandade. Por diversas razões, houve resistências a esse plano. Alguns membros da junta, assim como membros de A.A. de algumas cidades, se opunham à formação de uma Conferência. Bern acreditava que alguns Custódios se atribuíam o “direito de servir com exclusividade” e a Conferência de Serviços Gerais iria retirar-lhes esse direito.

Bern percebeu que ganhar cooperação “resultou ser uma tarefa muito mais difícil do que Bill e eu tínhamos imaginado”. “Finalmente, depois de um exaustivo debate e por maioria de apenas um voto, foi aprovada a resolução de realizar uma única Conferência experimental”, lembrou Bern em 1970. Esta Conferência não teve nenhuma autoridade real. Foi seguida de outras três Conferências “experimentais” nas que Bern serviu como presidente, até a Convenção Internacional de 1955 em St.Louis, onde, oficialmente, Bill deixou de ser líder de A.A. e a Conferência de Serviços Gerais se converteu numa parte permanente da estrutura de A.A. e numa força importante nas funções de serviço de A.A. Bern indicou que haviam sido necessárias mais três Conferências “experimentais”, além da de 1951, antes da proposta de torná-la uma parte permanente de A.A. Tanto Bill quanto ele concordavam que as mudanças dentro de A.A. nunca deveriam ser feitas de maneira abrupta, que devemos nos assegurar de estar certos antes de efetuar qualquer mudança.

A Bern parecia-lhe que a fortaleza intrínseca da Irmandade era tanta, que sempre ira haver tempo suficiente para mudanças. O mesmo princípio teve continuação anos mais tarde, quando foi mudada a composição de Junta de Serviços Gerais para ter uma maioria de membros alcoólicos. Bern tinha apoiado durante algum tempo essa mudança e, inclusive numa ocasião propôs que se demitissem todos os membros não alcoólicos. Esta proposta de mudança brusca foi rejeitada, embora com o tempo os membros alcoólicos chegassem a ser maioria. (N.T.: Em 1966, mudou a relação de custódios alcoólicos e não alcoólicos na Junta de Serviços Gerais: eram 15 membros, sendo oito não alcoólicos e sete alcoólicos e passaram para 21 membros, 14 alcoólicos e sete não alcoólicos dando, assim, aos Custódios alcoólicos a atual maioria de dois terços.).

Bern prestou um grande serviço à Irmandade, mas sempre deixou claro que ele tinha-se beneficiado de seu programa espiritual. Nas palestras que proferiu nas Convenções Internacionais, falava como não alcoólico, mas também dava mostras de que acreditava no programa de A.A. e aliviava seus princípios na sua própria vida. Sua irmã Josephine acredita que A.A. lhe satisfez uma grande necessidade espiritual. Nas suas palestras em assembleias de A.A. dava a impressão de que Bern falava como um membro, não como alguém não alcoólico.

Na Convenção Internacional de A.A. em 1970, em Miami Beach, pronunciou uma das suas melhores palestras. Embora Bill estivesse presente por alguns breves momentos, estava demasiado doente para participar de forma ativa, Bern o substituiu e proferiu uma palestra muito inspiradora sobre a unidade e a continuidade em A.A. Esta foi sua última palestra num evento de A.A. Embora tivesse um aspecto vigoroso e cheio de energia na Convenção, um mês mais tarde sofreu um ataque cardíaco mortal na sua casa em Nova York. Tinha 68 anos de idade e sua morte repentina provocou grande comoção na sua família e entre seus amigos.

Bill W. que faleceu em janeiro de 1971, descreveu a morte de Bern como uma grande perda pessoal “porque me apoiei nele durante muitos anos. Podia contar sempre com seus sábios conselhos apenas pedindo-os; desde o começo desfrutei de sua calorosa amizade”. E acrescentou, “desde esse mesmo começo, Bern Smith compreendeu os princípios espirituais em que a Sociedade de Alcoólicos Anônimos se baseia. É muito raro encontrar uma compreensão parecida em pessoas alheias à Irmandade. Mas Bern nunca foi uma pessoa alheia. Não apenas compreendia a nossa Irmandade, mas também acreditava nela”.

Leia também:

“Bernard B. Smith”, artigo de Bill W. em “A Linguagem do Coração”, pág. 446 – Junaab, código 104