Absoluta autossuficiência financeira

A política de finanças de Alcoólicos Anônimos

Olá, 

Voltamos a escrever-lhe, dessa vez para informar sobre a nossa política financeira, um tanto incomum.

Dentre as assim chamadas Doze Tradições de A.A. – princípios pelos quais nos organizamos como sociedade de alcoólicos em ação –, a Sétima Tradição sugere que “Todos os grupos de A.A. deverão ser absolutamente autossuficientes, rejeitando quaisquer doações de fora”. Isto é, nossos grupos “devem ser inteiramente autofinanciados pelas contribuições voluntárias [e anônimas] de seus membros. Acreditamos que cada grupo deve atingir, em pouco tempo, esse ideal; que qualquer solicitação de fundos usando-se o nome de A.A. é altamente perigosa (…). A experiência tem nos demonstrado, frequentemente, que nada pode destruir nosso patrimônio espiritual com tanta certeza, como discussões fúteis sobre propriedade, dinheiro e autoridade”.

As Tradições foram formalmente expressas onze anos após o início do movimento que gerou A.A. Ou seja, entre 1935 e 1946, os primeiros grupos buscaram doações externas e sofreram com disputas internas envolvendo dinheiro e autoridade. A certa altura, ninguém menos que John D. Rockfeller – antigo magnata norte americano – aconselhou nossos pioneiros a serem prudentes em matéria de finanças. O conselho foi acatado e chegamos até aqui unidos, praticamente isentos de problemas graves nesse campo tão problemático.

Sétima Tradição é praticada até hoje, não só pelos grupos, mas pela Irmandade como um todo, em todos os países nos quais nos estabelecemos. É plena de significados, implicações e desdobramentos.

Obviamente precisamos de algum dinheiro, mas, protegendo-nos do acúmulo de dinheiro e de fontes externas, temos obtido o necessário, entre nós mesmos, para tudo quanto desejamos e decidimos coletivamente realizar; evitamos ingerências externas que poderiam, com o tempo, desviar-nos de nosso propósito primordial; e evitamos disputas internas por poder e prestígio, além do fenômeno da corrupção.

Ainda, mantendo cada doação – de membros ou grupos – em um valor modesto (em alguns países é sugerido um teto), não nos tornamos ricos a um ponto perigoso. De fato, desde o surgimento de A.A., não tivemos grandes excedentes de contribuições sobre as despesas operacionais legítimas, as quais incluem, basicamente: a literatura oficial de A.A., revistas nacionais e nossos escritórios de serviços.

Para nós, serviço é tudo quanto possa nos aproximar de alcoólicos que ainda sofrem, para oferecer-lhes o mesmo que nos foi ofertado: o compartilhar de experiências, forças e esperanças. Assim, não prestamos assistência social, material, médica, jurídica, laboral nem qualquer outra.  Não temos nenhuma propriedade ou dinheiro que valha a pena disputar. Essas são vantagens das quais procuramos fazer o melhor uso possível.

Cultivamos um princípio de pobreza coletiva, angariando, entre nós mesmos, “Tão apenas as despesas correntes mais uma reserva prudente”, esta última equivalendo, geralmente, a três meses de despesas dos grupos – os quais são informais, não têm existência jurídica – e um ano de despesas nos escritórios locais, nacionais e mundial de A.A. (que operam mediante as exigências legais de cada país). Evitamos rigorosamente qualquer grande concentração financeira ou executiva, colocando nosso fundo de reserva a cargo de custódios não alcoólicos e dividindo nosso capital de giro entre as poucas operações existentes.

A preservação dessa política financeira há mais de 80 anos é, ainda, indício revelador das profundas modificações ocorridas em todos nós, membros. De fato, em nossa antiga vida de bebedores praticamos todos os tipos de irresponsabilidade. Desde tempos imemoriais dependemos de alguém, quase sempre financeiramente. Sempre nos mantivemos de mãos estendidas. Assim, “uma sociedade composta apenas de alcoólicos, dizer que irá pagar todas as suas contas constitui realmente uma novidade”, a qual trouxe “uma onda de confiança na integridade de Alcoólicos Anônimos” por parte de todos quantos estavam (e seguem) habituados a intermináveis campanhas para levantamentos de fundos. Pois significa que “os irresponsáveis tornaram-se responsáveis”.

Cabe informar, ainda, que é voluntário quase 100% do serviço realizado nos escritórios. Algumas poucas funções especializadas, desde que não diretamente relacionadas à missão de A.A. (tais como gerente, telefonista, contador, auxiliares administrativos e técnicos, limpeza, impressão gráfica, correios), são contratadas ou terceirizadas e, igualmente, autofinanciadas pelos AAs.

O real patrimônio de Alcoólicos Anônimos é a sobriedade dos membros. Consideramos seu valor imensurável e de difícil visualização, visto ser de natureza espiritual: traduz-se, por exemplo, em milhões de vidas úteis, afetando positivamente outros milhões; num número incalculável de crimes e violências não praticados; negligências, maus-tratos e acidentes não ocorridos; leitos livres em hospitais e clínicas; trabalhadores agora assíduos, produtivos e confiáveis; além de infinitos talentos e potencialidades em desenvolvimento. Por um lado, trata-se apenas da nossa obrigação, como cidadãos devolvidos à vida social. Por outro, desejamos e precisamos dividir tal patrimônio e, a cada vez que o fazemos, ele cresce exponencialmente.

Ao dividi-lo, utilizamo-nos de uns poucos suportes materiais. No Brasil, atualmente, estes incluem mais de 50 títulos de literatura oficial, potencialmente úteis dentro e fora de A.A., em ações de cooperação com serviços públicos e organizações privadas ou assistenciais; a revista Vivência, bimestral, em circulação ininterrupta há mais de 30 anos, contando, hoje, com cerca de 6.000 assinaturas ativas e que também funciona como ferramenta de sensibilização.  

Mantemos um sítio na Internet –https://www.aa.org.br/  – com informações sobre a Irmandade e onde funciona nossa loja virtual – loja-aa.org.br/  – para aquisições de literatura e revista; um canal anônimo de ajuda na rede social Facebook – Amigo Anônimo  –, que informa, orienta e, eventualmente, direciona os visitantes para os grupos mais próximos, indicando endereços, dias e horários de reunião.

Realizamos dois eventos nacionais: uma Conferência de Serviços Gerais, anual, com representantes eleitos em todo país, na qual prestamos contas a toda Irmandade e decidimos sobre nossas futuras ações coletivas; a cada quatro anos, organizamos uma Convenção aberta ao público, onde reunimos milhares de membros, familiares, profissionais amigos e população em geral, com a finalidade de apresentar A.A. à sociedade e celebrar nossa nova realidade. Além de centenas de eventos regionais e locais, organizados por nossas áreas, distritos e grupos.

Nosso escritório principal funciona na capital paulista, no bairro do Tatuapé, contando com dez funcionários contratados em regime celetista (não alcoólicos) e cerca de 70 AAs voluntários. Nossos 80 escritórios locais funcionam em todo território nacional, suportados pelo nível de organização regional de A.A., estruturado em distritos (conjuntos de grupos locais) e áreas (conjuntos de distritos); alguns destes escritórios contam com um funcionário contratado, outros operam com 100% de serviço voluntário.

Nossa enxuta estrutura existe unicamente para atender às demandas dos grupos de A.A. no país – atualmente, pouco mais de 5.000 – e às demandas oriundas da sociedade, sob a forma de pedidos de ajuda, solicitações de cooperação permanente e pedidos de aquisição de literatura e revistas.

Basicamente, isto é tudo quanto A.A. vem mantendo ao longo dos seus 70 anos de operações no Brasil. Desejamos ampliar sempre mais o alcance dos nossos serviços, tão somente para alcançar o contingente de alcoólicos que desejam parar de beber e/ou sofrer.

Por isso, agradecemos por sua atenção e disposição em continuar recebendo nossos informes!

Fraternamente,

Junta de Serviços Gerais de Alcoólicos Anônimos do Brasil

Comitê Trabalhando com os Outros