A abordagem que virou grupo

Numa “primeira reunião” diferente, o botão de um velho casaco… floresceu!

Certo dia, estava eu sofrendo com mais uma crise de autopiedade, quando bateu à porta um grande amigo meu e sua filha (a convite de minha esposa, que não suportava mais as minhas bebedeiras). Só que, naquele instante, pensei: “Lá vem esse chato querer dar-me conselhos de novo”. Eu não queria recebê-lo, mas minha esposa insistiu e eles acabaram entrando. Conversaram muito comigo, falaram-me de A.A. – e eu ainda não tinha ouvido falar de Alcoólicos Anônimos.

Hoje considero sagrada aquela frase que diz: “Dois ou três alcoólicos quaisquer, reunidos com a finalidade de manterem-se sóbrios, têm o direito de considerar-se um grupo de A.A., desde que como grupo não estejam filiados a qualquer outra organização”. Pois eu sou essa frase!

Aqueles dois me convidaram a fazer parte da Irmandade, mas como não existia grupo de A.A. na região, o amigo, ali em casa mesmo – e seguindo um antigo costume de entregar uma ficha ao novato como lembrança do seu ingresso – pegou um velho casaco da minha sogra, que estava pendurado na parede, tirou um dos botões e o deu a mim. E, apesar de estar torcendo para eles irem embora logo, o fato é que não bebi naquele dia e fui trabalhar pensando muito em tudo o que tinham me dito.

Passados vários dias, estando eu em abstinência e sempre com o apoio dos dois, decidimos fundar um grupo de A.A. em nossa comunidade. Nesse grupo eu quis “reingressar”, mas percebi que me tornei membro de A.A. lá mesmo em minha casa, pois “você será um membro de A.A. se assim o quiser”, apenas isso.

Com o tempo, venho reconquistando tudo o que me parecia perdido – principalmente a família, que saiu do inferno. Meus familiares e eu sempre nos lembramos do batizado do meu filho, ao qual compareci com o rosto desfigurado por uma briga no dia anterior – isso serve para eu não esquecer dos meus tempos de alcoolismo ativo, pois diz o velho ditado que “quem esquece o passado está condenado a revivê-lo”.

Continuo fazendo parte do mesmo grupo, que hoje tem três reuniões semanais, faz reuniões mensais de serviço e de CTO. Atualmente sou coordenador do CTO e, através desse trabalho, tento fazer com outras pessoas o que fizeram comigo. (Raimundo, Taboão da Serra / SP)

REVISTA VIVÊNCIA N°. 71 (MAIO / JUNHO 2001), p. 22.