Até hoje não achei que tivesse chegado a hora de expressar as minhas opiniões, seja com respeito a A.A. ou com respeito ao alcoolismo. Sempre achei que o assunto ampla e maravilhosamente bem coberto pela revista. Ultimamente, porém, dois problemas têm ocorrido vez por outra – o dos veteranos, e artigos referentes ao que Bill e outros chamam de “sobriedade emocional”.
Alguns anos atrás, o veterano era uma raridade – digamos até mesmo uns dez anos atrás, tão pouco. O lugar em que viviam , naturalmente, eram os estados do leste norte-americano; só um ou outro se encontrava no Canadá ou nos Estados do Oeste. Hoje em dia os veteranos são mais numerosos, mas por vários motivos estão novamente escasseando nas reuniões. Eis uma situação que não é boa para os veteranos, e certamente é muito ruim para A.A.
Vivo me surpreendendo com esta afirmação, que às vezes se ouve em reuniões: “Em A.A. não existe senioridade.” Ora, essa afirmação pode facilmente qualificar-se como uma piadinha de salão. A pessoa que cunhou essa belezoca deveria ter explicado que a falta de senioridade – ou seja de uma hierarquia por antiguidade – somente se aplica em relação ao primeiro gole. De outra forma, como aceitar e explicar o pouquinho de progresso diário que nos é prometido no Livro Azul, desde que aceitemos praticar em todas as atividades de nossas vidas os Doze Passos, integralmente?
Há montes de senioridade em A.A. A senioridade da sabedoria adquirida com o correr dos anos. A senioridade da compreensão, da tolerância com relação aos problemas de companheiros mais doentes do que nós. A senioridade da fé, que nos torna capazes de amarmos o nosso Poder Superior e confiarmos Nele, que nos permite perdoar e amar nossos vizinhos, e nos ensina a nos amarmos e perdoarmos a nós mesmos também.
Na sua última grande palestra, o nosso co-fundador Dr. Bob enfatizou bastante o que lhe aconteceu quando ele se afastou demais dos “rapazes da enfermaria”, e creio que é a mesma coisa que acontece com todos nós quando esquecemos que a nossa sobriedade é condicional, que só permanece enquanto passarmos adiante o que alguém uma vez se dispôs a passar para nós. Não acredito que Deus nos tenha dado a sobriedade para racionalizarmos o serviço à comunidade, em substituição ao serviço dentro de A.A. Os veteranos precisam da associação constante com A.A. para manterem aquela calorosa satisfação interna que tão bem conheciam quando frequentavam A.A. havia uns dez meses, e que perderam lá pelos seus dez anos.
O Grupo precisa de sua presença nas reuniões, pois assim proclamam eles a sua própria necessidade de estarem presentes. Membros mais novos, por sua vez, lembrarão esse exemplo e mais tarde, quando se tornarem veteranos, também lá estarão. E assim A.A. se fortalecerá e crescerá.
Se o novato é o sangue que dá vida a A.A., então o veterano é nada menos que o banco de sangue de A.A. Vejamos alguns fatos: os primeiros veteranos escreveram o Livro Azul, e sua inspiração e sabedoria se transfundiram para nós. Em Manitoba, A.A. foi iniciado por um membro que veio de Minneapolis. Ele e seus companheiros nos disseram o que poderíamos fazer, e quais as coisas que seria melhor não fazermos. Poupou-nos muitos anos de tentativas e erros, o que é mais importante, com mais de dezoito anos de sobriedade continua a frequentar o Grupo, e sua presença proclama, em brados mais altos do que quaisquer palavras, o que essencialmente está repetido em cada página do Livro Azul: que a nossa sobriedade nos é concedida a cada vinte e quatro horas, e é condicionada ao nosso estado espiritual.
É claro que os veteranos são importantes, portanto, que o saibam! Talvez não sejam necessários para prover os afazeres do Grupo ou controlar as finanças, mas se os veteranos em cada área forem frequentadores fiéis e assíduos das reuniões, então não teremos que nos preocupar com os novatos – eles estarão em boas mãos. É bom lembramos o que o “A.A. Número Três” disse à sua esposa quando Bill e o Dr. Bob o visitavam pela segunda vez: “Esses são os rapazes de quem te falei; esses são os que entendem”.
(Vivência nº 6, jan./mar., 1988, pág. 33)